Os capacetes de motociclismo e a nova Norma UN ECE 22.06

 


Uma nova norma europeia que vai entrar em vigor no final de 2021 vai garantir aos capacetes de motociclismo uma maior capacidade de proteção, mas não só!        

Aqui no Andar de Moto já escrevemos tantas vezes sobre capacetes, que eventualmente corremos o risco de nos tornarmos repetitivos, mas se o fazemos é porque acreditamos que o tema é mesmo relevante e faz parte de uma estratégia para salvar vidas.

Muitos de vós ainda se hão de recordar de quando não era obrigatória a utilização de capacete de proteção para andar de moto, ou de o trazermos apenas pendurado no braço, talvez para proteger o cotovelo de uma queda (todos ouvimos dizer que a dor de cotovelo é tramada!).

Mesmo nos dias de hoje ainda há países onde a sua utilização só é obrigatória em determinadas circunstâncias, por exemplo fora das localidades ou dispensada em veículos com cilindradas inferiores a 50 cc. Em Portugal, pasme-se, nas bicicletas e trotinetes elétricas o seu uso não é obrigatório (vide DL n.º 102-B/2020, de 9 de dezembro, que altera o Código da Estrada e alguma legislação complementar e entrou em vigor a partir de 9 de janeiro de 2021)! Como se o impacto da cabeça numa esquina do lancil, após uma eventual queda duma trotinete a 25 km/h, não fosse igualmente grave!

De qualquer modo, sem querer entrar em polémicas, o objetivo deste artigo é trocar convosco algumas impressões sobre a nova norma de Homologação a que estarão sujeitos os novos capacetes na Europa, e não só, a partir de 2023. A chamada Norma UN ECE 22.06, que vem substituir a ECE 22.05.

Como tudo começou…

Ao que consta, até ao acidente mortal de Thomas Edward Lawrence (mais conhecido por Lawrence da Arábia), aos comandos duma Brough Superior SS 100, no ano de 1935, quase não se usava proteção para a cabeça ao andar de moto, isto apesar do capacete já ser conhecido e utlizado pelo menos desde a I Guerra Mundial... 

Ao analisar as lesões cerebrais mortais que Lawrence da Arábia sofrera, o neurocirurgião, Australiano, Hugh Cairns começou a debruçar-se sobre a perda de vidas de motociclistas após acidentes de moto, causadas por ferimentos na cabeça e a tentar perceber como as mitigar. Já contámos a história aqui

Em 4 de outubro de 1941, Cairns publicou no British Medical Journal um artigo intitulado “Head injuries in motor-cyclists. The importance of the crash helmet.” Nele mostrou que em 2.279 motociclistas e passageiros falecidos em acidentes durante 21 meses da II Guerra Mundial, as lesões na cabeça eram a causa mais comum. Da sua análise percebeu-se também que os motociclistas que sofreram quedas, mas usavam capacetes no momento da queda, sobreviveram praticamente todos! 

Já na década seguinte, mais precisamente em 1953, foi feita a primeira patente do capacete por Charles Lombard, um investigador da universidade do Sul da Califórnia. Já se aproximava bastante da construção que ainda hoje se usa: um interior acolchoado para absorver a energia do impacto e uma calota exterior, leve e muito resistente, arredondada para dissipar a energia de impacto.

Daqui para a frente a evolução foi imparável: começaram a ser utilizados novos materiais e tecnologias, nasceram alguns dos principais fabricantes, como é o caso da Bell, e da AGV que ainda hoje existem, mas a obrigatoriedade do uso de capacete de proteção para andar de moto demorou muito tempo a tornar-se realidade. 

Em Portugal só com o Decreto Regulamentar n.º 69/85, de 26 de outubro, na nova redação do artigo 31.º (Instrumentos acústicos e capacetes de protecção) é feita menção à obrigatoriedade do uso capacete e são instauradas coimas no valor de 1500$00 a 7500$00 (de 7,5€ a 37,5€, sensivelmente).

ECE 22.05 para ECE 22.06. O que muda?

A definição de standards, a certificação e homologação de capacetes acabou por se tornar uma necessidade premente à escala global, existindo hoje várias normas com regras e procedimentos próprios:

DOT (U.S. Department of Transportation) – seguida nomeadamente pelos Estados Unidos;

AS  (Road Safety Comission) – como o próprio nome indica, em especial na Austrália;

JIS (Japanese industrial standards) – ou seja, a norma japonesa;

ECE (Economic Comission for Europe) – Europa e corresponde à apresentada pelas Nações Unidas, sendo aceite em muitos outros países como a Rússia ou a Austrália, num total de quase 50.

A própria FIM (Federação Internacional de Motociclismo), presidida pelo português Jorge Viegas, tem um programa de homologação específico, desde 2019, que define quais os capacetes que cumprem os seus requisitos e podem ser usados nas competições internacionais sob a sua alçada.

A homologação ECE 22.05, preconiza que todos os capacetes, para serem homologados, têm que passar o teste HIC (Head Injury Criterion). Nos testes são avaliados critérios como a capacidade de absorção, a resistência dos sistemas de retenção, a qualidade óptica e resistência ao impacto da viseira, entre outros.

Importa ainda distinguir os diferentes tipos de capacete: P (integrais), J (Jets) P/J (Modulares) e que os vários países têm todos um código específico de homologação nacional (letra E mais um número) por país. No caso Português é o E21. Aproveite e veja a informação que consta do seu, além do tamanho ou do peso.

Especial destaque merece também o sistema inglês de teste de capacetes, conhecido mundialmente por SHARP. Não é propriamente uma norma, mas antes um organismo especializado em testar capacetes que estão disponíveis no mercado inglês. Muito focado na questão da segurança é-lhe reconhecida grande credibilidade e a forma como classifica os capacetes de 1 a 5 estrelas pode ser um bom guia para a compra. No entanto, factores como a insonorização e a ventilação são completamente ignorados.

Nos Estados Unidos existe o equivalente Snell, também muito exigente e rigoroso, ainda que mais direcionado para a realidade americana.


Voltando à norma ECE 22.05, podemos considerar que a mesma está ultrapassada, pois já tem cerca de 20 anos, o que considerando os standards atuais é muito tempo, apesar de ter sofrido várias atualizações. 

A Nova norma, elaborada pela Europa e em estreita colaboração com as Nações Unidas vai abolir completamente a anterior a partir de 2023, estando entretanto a decorrer um período de adaptação para os fabricantes (que também existem em Portugal) e para as empresas importadoras ou representantes irem gerindo os seus stocks. A data limite de produção de capacetes com a ECE 22.05 é 1 de julho de 2023 e a de venda, 31 de dezembro de 2023.

A ECE 22.06 será muito mais exigente, sobretudo em prol da segurança. Vão ser testadas novas zonas de impacto, a outras alturas de queda e a maior velocidade, dada mais ênfase na aceleração rotacional, igualmente extremamente perigosa... Por outro lado, vão ser também regulados acessórios como intercomunicadores e action cams e até o grau de opacidade nas viseiras solares será revisto, além de uma análise mais detalhada aos capacetes modulares, muito populares na atualidade.

Tudo isto será feito em favor da segurança e do conforto dos motociclistas… e é natural que as normas utilizadas nas restantes zonas do globo também tenham que se adaptar e definir novos standards, mas há 2 aspetos que o consumidor final não pode esquecer:

  1. É previsível que os capacetes venham a aumentar de peso ou, em alternativa, se utilizem materiais ainda mais leves e igualmente resistentes, como a fibra de carbono ou o kevlar;

  2. Os preços de venda vão seguramente subir! É difícil falar de valores, apesar de já existirem à venda capacetes homologados pela norma ECE 22.06.

Em resumo, a fase de transição está a decorrer e é fundamental que todas as partes envolvidas tenham consciência disso!

Quanto a nós, consumidores finais, agora pode ser uma boa altura para adquirir capacetes ainda com a Norma ECE 22.05 já que os preços tendencialmente vão baixar, um pouco na lógica do que sucedeu, por exemplo, com as motos homologadas com a norma Euro 4. 

Mas se a segurança é a sua maior preocupação, já pode adquirir um capacete de acordo com a nova Norma, como é o caso do Arai Quantic 2021, ou o Nolan X-Lite X-1005 Ultra Carbon, ambos já estão disponíveis no nosso mercado.



https://www.andardemoto.pt/moto-news/54539-os-capacetes-de-motociclismo-e-a-nova-norma-un-ece-22-06/

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Roteiros - Bom, bonito, barato (e pertinho de Brasília): 20 destinos que você precisa conhecer

Honda Africa Twin 1100 Adventure Sports DCT: primeiras impressões

10 Fatos Furiosa Ninja ZX-6R 2020 no Brasil